30 de mar. de 2015


UM DOMINGO QUALQUER

Jogar futebol no Panelão todo domingo é sagrado. Praticamente o único compromisso certo para o fim de semana desde 2003, quando comecei a jogar com os amigos de infância no Parque Cecap, em Guarulhos.

Com a idade e alguns quilos a mais, fui passando do ataque até a lateral direita, onde tento enganar o tempo e o peso na pelada de fim de semana.

Quem joga na lateral sabe que o mais importante para você ir bem ou mal é o adversário. Quando o juiz apito e aquele atacante magrelinho, de canela fina, corre para o seu lado você já sabe que terá muito trabalho.

Por outro lado, tem vezes que aparece aquele pivosão à moda antiga, alto, forte e desengonçado. Sinal de que terei espaço para atacar, ele já se enfia entre os zagueiros e só sai de lá quando o árbitro apita o final do jogo. 

Mas este último não foi um domingo qualquer. O 11 deles não era alto nem baixo, forte fisicamente, rápido e habilidoso. Só no olhar que dei para o zagueiro nós sabíamos que o trabalho seria dobrado.

E foi mesmo, nos revezamos na marcação, as vezes os dois iam para dar conta do 11. Meu zagueiro levou amarelo logo no começo do jogo e ai não podia mais falhar.

Ele driblou, foi pra linha de fundo, acertou a trave, mas o gol deles não saia.

Em uma jogada na beira de campo tive que disputar com ele na corrida e mesmo com alguma vantagem de distância só consegui dar um biquinho na bola, com a ponta da chuteira. Exageros a parte, senti até um principio de infarto, o coração deve ter chegado aos 200 batimentos por minuto.

Fim do primeiro tempo e o alivio. 0 x 0 no placar e metade da missão cumprida. Água, sombra, descanso, e quando volto para o campo, uma grata surpresa. O 11 foi jogar do outro lado do ataque.

Foi o tempo de subir uma, duas vezes ao ataque. Após cobrança de lateral voltei naquele trote maroto, de quem precisa ajudar na marcação mas não pode desperdiçar forças demais.

Quando olho para a zaga, lá está ele novamente, o 11 e volto correndo para a minha posição. 

“Vai pro outro lado, amigo. Tava bom demais por aqui sem você”.
Senti que o time adversário também cansou, a bola não chegava mais ao ataque com a qualidade de antes e aproveitamos para abrir dois a zero. 
Nosso time é muito bom tecnicamente, mas normalmente cede espaços demais no segundo tempo e abrir dois a zero surpreendeu a todos, até pela dificuldade do jogo.

Tudo correu tranquilamente, até os minutos finais. O 11 correu aberto pela ponta e deu um corte seco para o meio, deixando nosso zagueiro na saudade. Corri na diagonal e antes dele entrar na área consegui agarrá-lo e fazer a falta. 

Quase não deu tempo nem sequer para agarrar. Cartão vermelho direto. 
Ainda apelei com o árbitro que eu não era o último homem (tinha mais um jogador do nosso time certa de 15 metros do lance), mas não teve jeito.

Sai sob aplausos do nosso time.

“É isso mesmo, não tinha o que fazer”, disse o goleiro.

“Precisamos de gente assim, comprometido com o time”, elogiou o treinador.

Antes de ir pro chuveiro ainda vi o 11 bater a falta pra fora. Tinha certeza de que não perderíamos mais o jogo. E não perdemos.
De banho tomado, sentei atrás do gol para descansar e tomar uma Fanta Laranja. Nisso passou o capitão do time deles.

“O parceiro, nosso time é de veteranos. Como você traz um menino desse pra jogar aqui”, brinquei com ele, que respondeu.

“Ele é muito bom mesmo. Jogou na base do Santos com o Neymar, Geovânio”...

Não foi mesmo um domingo qualquer.